segunda-feira, 28 de maio de 2012

Mais raro que breve...

Às vezes a ficção dá-nos a ideia de que é possível, nomeadamente de que é fácil. Fácil viver, fácil perder e ganhar, fácil perder e encontrar, fácil o encontrar. Porém a realidade, sem delicadeza ou suavidade, mostra-nos que o encontrar é tão raro. Relembram-se os verdes anos, o tempo em que todos os sonhos eram possíveis (quando a ficção não nos era tão extrínseca,  mas misturava-se em nós como coisa vivida). Nesses tempos não houve a generosidade dos deuses na abundância dos encontros, mas disso não se reclamava. Houve o frémito da pequena emoção, do olhar que se roubava, do sorriso ou toque que se resgatava. Achava-se, à época, que tal era privilégio raro, e como o tempo passava lento demorávamos-nos no viver de tais emoções, não pensando na raridade.
Hoje sabe-se que, ainda que tudo seja tão breve, é mais raro que breve.

sábado, 19 de maio de 2012

do silêncio...

 Federico Mompou, Musica Callada, Silent Music


"424 - Quando estiveres cansado de olhar uma flor, uma criança, uma pedra, quando estiveres cansado ou distraído de ouvir um pássaro a explicar o ser, quando te não intrigar o existirem coisas e numa noite de céu limpo nenhuma estrela te dirigir a palavra, quando estiveres farto de saberes que existes e não souberes que existes, quando reparares que nunca reparaste no azul do mar, quando estiveres farto de querer saber o que nunca saberás, se nunca o amanhecer amanheceu em ti ou já não, se nunca amaste a luz e só o que ela ilumina, se nunca nasceste por ti e não apenas pelos que te fizeram nascer, se nunca soubeste que existias mas apenas o que exististe com esse existir, quando, se -, porque temes então a morte, se já estás morto?"

                                                
                                                Vergílio Ferreira, pensar,1993 Vergílio Ferreira

domingo, 13 de maio de 2012

da lentidão


Continua-se a ter tão pouco para dizer, torna-se o silêncio mais presente.
Há lugares, cidades, que se visitam, outros países, lugares com gentes, cheiros e olhares, porém falta-me o tempo para a demora necessária do sentir.
Olhar e sentir exige-me tempo, preciso da lentidão no andar, no olhar...
sempre a lentidão, ainda que seja a velocidade que impera e comanda os dias.
E fica o silêncio porque não se acha o que escrever, e porque o sentir cala o pensar.
Fica o silêncio porque não se acha o que escrever  face ao tédio...
Fica o silêncio no encontro das palavras escritas dos outros
Fica o silêncio porque morre quem tinha mais vida, mais arte, mais música...
Fica o silêncio porque da espera já não lembro.